segunda-feira, 21 de janeiro de 2019

O CARNAVAL E AS RUAS VAZIAS

Era o carnaval e as ruas vazias.

Mas era o carnaval, particularmente no carnaval, o sabor mais amargo das ruas vazias, dos ventos desérticos, empoeirados, batendo nas portas fechadas das lojas.

Tudo fechado, casas e bares... e nem os bares, sequer os botecos mais vagabundos dos lugares mais recônditos, ficavam abertos. Supermercados, farmácias, famílias e hospitais, as pessoas fugiam como fantasmas de Miguel da Palhoça rumo a qualquer lugar, qualquer canto de praia ou de rio onde pudesse haver confete, máscara, cerveja, muita cerveja, e axé music.

Jamais a cidade testemunharia um baile de carnaval ou um bloco de rua.

Mal tinha ainda a noção de ser gente, e Fernando, lá pelos oito ou nove anos, ansiava desaparecer dali, e principalmente no carnaval. Os amiguinhos da escola, os parentes, os vizinhos e toda a molecada, mesmo os mais pobres, tinham algum lugar para se enfiar... ninguém queria ficar na Palhoça no carnaval, ninguém veria a solidão se ampliando para as ruas como um castigo.

No entanto, ali estava Fernando, sem idade, sem dinheiro, sem companhia e sem destino... não entendia como os pais suportavam aquilo com uma tranquila e ao menos aparente indiferença... pior era a chegada do povo na quarta-feira de cinzas, todos cheios de si e de histórias de si, de bebedeiras e de sexo barato, tendo gastado as economias anuais, juntadas mês a mês, para enfim gozar algum prazer.

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